domingo, 5 de fevereiro de 2012

Tenho uma tese sobre a melancolia
que vi num velho samba, que vi na alegoria.
Gato Zarolho.




Abre essa porta
Prepara a fantasia

Pinta a tua cara
Dá cor à alegria e
Vai seguindo o bloco até o fim do dia
É pleno o carnaval? É pleno o carnaval?
Não É...
Gato Zarolho.




Acabou o baile de mascaras, Foi uma bela festa, as fantasias estavam absolutamente extraordinárias. 
Enquanto os últimos casais se dirigiam a porta embebidos de luxuria, ébrios amantes deixando o salão com suas gargalhadas estridentes e olhares sedutores, a Colombina em seu belo vestido furta-cor deixava que o sal de seus olhos tocassem a fonte do jardim.
Seria o último pranto, de um reflexo tão brilhante quanto um diamante lapidado. Seu olhar fixo mirava os confetes espalhados no chão, e neles contava as juras e promessas silenciosas de amor, de uma história de amor ao avesso.
As serpentinas em espiral que cortavam o salão como estrelas cadentes as quais entregou seus desejos de dividir cada minuto com o Pierrot. Era tudo tão certo que eles já anteviam um final feliz para esta história sempre tão carnavalesca.
Mas o medo lhe assaltou, o aroma do lança perfume trouxe confusão tamanha que por alguns segundos trincou a certeza dentro dela.
O Pierrot não demorou mais que o tempo de um olhar para entender o redemoinho dentro dela, o que ele nunca entendeu é que seria o único capaz de resgata-la deste devaneio frenético no qual se encontrava, estendendo sobre sua face e colo suas verdades.
Quando Colombina correu em direção ao jardim, Pierrot não foi atrás, entregou-se novamente ao seu violão e as ladeiras percorrendo o caminho inverso daquele encontro.
A menina lá mesmo ficou, misturou-se as estátuas do jardim, onde ninguém jamais a distinguiria novamente, deduziu ter ido embora aquele que poderia ter  rasgado sua fantasia mostrando a crua mulher por debaixo dos paêtes e purpurina, a carne pele que ela acreditava não existir mais, que porém sangrava ecoando em algum deserto dentro dela cujo caminho de volta havia esquecido.
Decidiu então nunca mais largar as fantasias, pois os carnavais vem e vão, mas os personagens sempre estarão lá em seu guarda-roupas esperando por sua vontade de desfilar, afastando-se cada vez mais.



Se num dia triste, triste eu ensaiar

Com a mão no bolso um pedido pra voltar
Vou guardar meu choro sofrendo calado
No bolso um bilhete com um samba safado.

Gato Zarolho.




Eu conheci uma menina que eu já conhecia
de outros carnavais, com outras fantasias
ela apareceu, parecia tão sozinha
e parecia que era minha aquela solidão.
Engenheiros do Hawai.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011


Se já não sinto os teus sinais, pode ser da vida acostumar,
Será? Moreno.
Sobre estar só eu sei, nos mares por onde andei,
Devagar, dedicou-se mais o acaso a se esconder,
E agora o amanhã, Cadê?
Dois barcos-Los Hermanos



 Por entre os dedos da minha mão passaram certezas e dúvidas,
Pois no dia em que ocê foi embora,
Eu fiquei sozinho no mundo, sem ter ninguém,
O último homem no dia em que o sol morreu.
O último pôr-do-sol- Lenine 




As paredes rabiscadas assistiam aquela menina; toda ela era intensidade, sorvia vez ou outra um gole de paixão-rasgada tinto, a fumaça do cigarro desenhava uma tempestade que não existia em lugar nenhum da casa a não ser em seu pranto.
A menina desejou que a chuva pudesse esconder as lágrimas, mas não havia chuva e mesmo que houvesse não conseguiria levantar-se da caixa de som que enchia o quarto já sem móvel algum, já era retrato da ausência.
Insuportável vê-la assim tão frágil lutando para desvencilhar-se da descrição perfeita da sua impotência.
Atrás da porta, seu coração antes alimentado por verdades fúcsia e olhares-frase agora não batia.
Tem horas que é imprescindível desligar o coração, este pálido pequenino não entenderia ver o amor ir embora, iria de certo adoecer, o sabor deste momento que fica marcado no paladar é todo insanidade.
Nestas horas agente se pergunta se Deus se esqueceu? Ou tirou férias?
Quando o ônibus partiu algo dentro dela se estilhaçou, algo que nem ela mesma sabe onde fica, a única certeza é de que jamais irá se consertar, mesmo nos reencontros em que agente esbarra com nossos antigos personagens, devolverá este algo-estilhaçado.
Triste endurecer o coração mas é a única saída, endurecer não empalidece só as dores, empalidece também as cores dos sonhos.
Sonho este, moreno que é como estrela cadente. Ser una em teus braços, um dia destes me perder em teus lençóis de águas frescas, e sorrir  na medida em que um dia foi saudade.
Temer fechar os olhos por estar sonhando acordada, viver o sonho, que deliciosamente me despertaria o coração novamente, faria de cada segundo uma moldura de felicidade.
Te quero assim... a fazer ciranda em meu umbigo, a embelezar meus cabelos com as estrelas que alcanço  ao encostar teus lábios nos meus.
Me ensinasse tanto sobre amar no silêncio do teu colo, que tuas partidas anteriores vieram estirpadas de dor.
Lembro a todo instante o sabor de ser tua menina-mulher, me ver nos teus olhos sedentos enquanto eu dançava encantos e véus para enfeitar nosso leito com as brincadeiras da menina e o sentimento da mulher, sentir o encaixe perfeito de nossos corpos.
Te gosto tanto que me completo na tua liberdade, desejo que a vida por estas veredas meio tortas te faça sorrir.
Já que nos perdemos, nestes re-desencontros em que vivemos alguns passados sem desenhar um futuro. Resta então menina, mal traçar linhas tortas a carvão, no mesmo tom que colore seu canto agora, perceber que a trilha sonora desta história desde sempre anunciava seu significado, banhar-se no oceano salgado do teu olhar, enterrar os fantasmas de teus sonhos tão bem cultivados junto ao último pedaço do teu coração, sangrar melancolias até enlouquecer, e andar por aí representando viver. 


Quando olhas-te bem nós olhos meus,
e teu olhar era de adeus,
juro que não acreditei, 
eu te estranhei, me debrucei sobre teu corpo e duvidei.
Atrás da porta-Chico Buarque


I want you, I want you, I want you
I think you know by now
I'll get to you somehow
Until I do I'm telling you so you'll understand
I love you.
Michelle-Beatles

Dedicado a Alessandro Carvalho e Silva













terça-feira, 26 de julho de 2011



"E tudo que eu andava fazendo e sendo eu não queria que ele visse nem soubesse, mas depois de pensar isso me deu um desgosto porque fui percebendo (...) que talvez eu não quisesse que ele soubesse que eu era eu, e eu era."
Caio Fernando Abreu




"Chorar por tudo que se perdeu, por tudo que apenas ameaçou e não chegou a ser, pelo que perdi de mim, pelo ontem morto, pelo hoje sujo, pelo amanhã que não existe, pelo muito que amei e não me amaram, pelo que tentei ser correto e não foram comigo."
Caio Fernando Abreu



Esta não é uma carta de amor; é uma despedida de um "quase amor". Ao escrevê-la pude perceber o quanto o quase é dolorido e venenoso, o quanto ele corrói e despedaça, o quase se forma a partir de várias coisas, mas uma delas e talvez a mais inconformadora é a unilateralidade.
Imaginei você chegar em casa e me encontrando a meia luz na mesa da sala, a garrafa de vodka pela metade, o cigarro no cinzeiro, meu olhar fixo nas folhas que o vento espalhava, trajando uma camisa de banda de rock ou do velho time da escola, óculos de grau no rosto e uma lágrima melancólica.
Ao fundo Janis Joplin embalaria aquele meu momento, e você me daria o espaço do meu momento porque conhecia muito bem os fantasmas que escondo na alma; mas saberia delicadamente como me tirar dele com uma massa feita por você e conversas triviais, faria sua dose e passaria a mão e o olhar sobre os papéis.
Ao acordar iria se deparar com meu rímel e lápis de olho borrados ressaltando a cor do mar dos olhos de Capitú, e eu veria nos teus a certeza.
Um beijo na testa e mais um bom dia, nesse nosso particular infinito em que encontras em mim todas as mulheres que desejas, porquê era eu.
Me admirarias no espelho, e eu fui e sou só tua, num consentimento delirante que me completava e não soubeste.
Por isso te escrevo meu grande amor não vivido, o que cativaste e não viste crescer. As mensagens ainda estão no espelho a provar que foi real.
De vez enquando estou na mesa da sala, a meia luz, e a lágrima está lá.



"Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas."
Antonie de Saint Exupéry




"Ora, há só um modo de escrever a própria essência, é contá-la toda, o bem e o mal."
Machado de Assis

sexta-feira, 1 de julho de 2011

"Sou uma mulher madura que as vezes brinca de balanço, sou uma criança insegura, que as vezes anda de salto alto."
desconhecido.



"Na vida do homem o amor é uma coisa a parte, na da mulher é toda a vida"
Lord Byron






Movimentava-se cadenciadamente em seu balanço na árvore, aquele movimento lento e marcante lhe devolvia a proteção do colo de mãe, mesmo sendo seu corpo frágil a produzir a impulsão, ela não se cansava, eternizava sua aparente calma ali.
Bem longe, onde estavam as estrelas tinha certeza de ser o seu lugar, e todas elas pertenciam a seu céu particular, tentava brilhar e não entendia porquê sua pele branca não refletia as cores que trazia na alma, e não eram só cores haviam tantas coisas lá.
Montava castelos, de areia de cartas, se questionava quando os ventos do sul os espalhava e tornava as cartas e os grãos sem sentido, ela entristecia. Mas não conhecia outros tipos de castelo, e sempre que o sol lambia o orvalho ela se punha a realizá-los novamente.
As vestes da princesinha estavam em trapos, sequer lembravam o lindo vestido que costurou a mão com pedaços das asas das fadas que encontrava no bosque de cedros de seu coração.
Os móveis da velha casa cobertos de poeira-saudade, e os corvos da plantação grasnavam lembranças que a entrecortavam, causando tempestades.
Não haviam mais imagens nos quadros, e nem nos espelhos, ela estava só e ninguém viria lhe buscar.
Só lhe restavam as sapatilhas de onix que cintilavam canções embalando seu corpo até a exaustão profunda dos sonhos, o único lugar em que ela o tinha novamente.




"A recordação da felicidade já não é felicidade, a recordação da dor ainda é dor."
Lord Byron



"Não falo, não suspiro, não escrevo seu nome.Mas a lágrima que agora queima minha face me força a fazê-lo."
Lord Byron






Dedicado a Kaio Phelipe.

quarta-feira, 13 de abril de 2011







"Eu deixo aroma até nos meus espinhos,
ao longe, o vento vai falando de mim."


"Viajo sozinha com o meu coração
Não ando perdida, mas desencontrada
Levo o meu rumo na minha mão."



As poetisas nascem da junção das dores salgadas largadas num canto, atiradas com asco, e de corações partidos; ainda mais das partes esquecidas.
Assim como as flores brotam nos jardins, sedentas, rasgadias, ruborizadas de sede, por absorver doentiamente o líquido que as refresca e fortalece seus espinhos, lhes dá a beleza com que encantam seus súditos.
O que as poetisas e a s rosas tem em comum?
Poetisas tem espinhos na alma, eles nascem a cada amor não correspondido, a cada sonho deixado no caminho, nascem para evitar mais despedidas sem saber que passam a causá-las.
Há estrelas em seu olhar, que ecoam brilho quando as bailarinas abrem suas caixas de Pandora que pulsam alucinadamente.
Dentro das caixas existem rosas, fitas, confetes, bombons, amor, e muitas, muitas reticências... Tanto amor que abençoa seus seguidores com os segredos da insanidade apaixonada e desmedida que os levam a prender-se pela própria vontade.
As pétalas são enlaçadas com as cordas dos instrumentos que os anjos abandonam, se puder tocá-las sentirá em sua textura a medida exata do toque, da pele, dos lábios, das damas que empunham como maior arma contra os obstáculos a suas buscas, o fervor eloquente de seus lápis.
São capazes de sustentar em seus braços tanto o mundo, quanto a abstração, envolvem o universo da proteção mais leve possível.
Traduzem o vento em sinfonia, encantam a chuva com sua expressões, ensinam o fogo a dançar, forjam no ferro armaduras cintilantes banhadas na coragem que sorvem lambendo suas feridas, e diluem em saliva.
Com as pernas sustentam mais seu peso, mais do que seriam capazes fisicamente, e isto é o que menos importa.
Bailarinas e rosas representam; truques com transparências, jogos de verdades deliciosamente contraditórias. Na tentativa de tornar lúdico, o fato lancinante de um par, metades do mesmo lençol.
Delicadamente escolhemos as fantasias, que uma a uma nos revestem de lascívia e candura, cada qual a seu modo e a seu tempo, tão breve quanto um desabrochar. As fantasias são um prelúdio para a bailarina; receber ao final de seu espetáculo um buquê com versos num bilhete perfumado.
Estava indiscritívelmente linda em sua exaustão, enquanto ouvia os aplausos, foi possível ler seu semblante, questionava-se tristemente com olhar nublado, quem seria ela realmente?
Talvez tenha se perdido entre tantos personagens, ou os tenha agregado, não consegue distinguir sua natureza, fracionou-se ou introjetou das Deusas, loucas, princesas e assassinas, colombinas e meretrizes.
O vazio brilhante no olhar, a leveza aquática de sua arte, a saudade traduzida em movimentos, a doçura de seu coração que distribui com maestria.
Que imagem lhe reflete seu camarim? Que cor tem sua maquiagem?
A lua ilumina o palco onde a guerreira travou sua última batalha, ao fecharem as cortinas, os que estavam nas cochias puderam vislumbrar a mágica de entender que os versos do bilhete, as rosas e a bailarina, todos são desdobramentos visuais da mesma essência.


"... E por perder-me é que vão me lembrando,
por desfolhar-me é que não tenho fim."

    

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
"Eu canto porque o instante existe e a minha vida está completa.Não sou alegre nem sou triste:sou poeta."

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

"Para entender o coração e a mente de uma pessoa, não olhe para o que ela já conseguiu, mas para o que ela aspira."
(Khalil Gibran)

                       
                          
“Deve existir algo estranhamente sagrado no sal: Está em nossas lágrimas e no mar.”

                       

Dizem que os apaixonados tem mais liberdade para mentir; dizem tambêm que alguns passam a dizer só a verdade...
Ora menino, eu não consigo, não mais tecer meus dias em arco-iris e minhas noites em negro escarlate, eu não consigo mais criança; não voltar, e não me revoltar em ti.
Ao te montar em minhas emoções é impossivel não me excitar, não querer o peso das tuas mãos em minha cintura e o silêncio ensurdecedor, que me tira a saliva da boca, que dilata minhas pupilas e fixa meu olhar na lembrança da contradição. São deliciosos estes canteiros meeiros em que damos as mãos tateando os caminhos, vias opostas, mãos duplas, que me enchem os olhos de dor líquida e salgada me roubam esperança em forma de estrelas.
Tu me perpassaste, dilacerasse deliciosamente, e nem mesmo me conheceste, percebeu quem sou, a mulher que sou, e que permaneço depois que nosso encanto acaba, nunca me declararia a ti a menos que fosses tu a sofrer com minha ausência, confidencio sozinha aos meus lençois as perdas que em cada segundo de intensa libido me presenteias.
Me destes asas denovo; é bem verdade que são asas partidas, asas Ícaras, e é este o segredo que não posso compartilhar, a não ser nalgum dia em que sentires Khalil Gibran Khalil, e isto não quero para ti, maldições estas que recolho como belos tecidos, coleciono em seus detalhes sórdidos toda beleza daqueles que já nascem com o coração a pulso, sangrando amores que se remontam no galgar ou se escolhem na falta de si mesmo.
Eu, eu sou exagero, o absurdo me completa, o intenso me compõe, e ao teu lado eu calo. Na contemplação que só tua presença pode explicar, no erotismo dos contrastes das cores, das texturas, e temperaturas, me recolocam no labirinto caleidoscópico do que sinto por ti, segredo irônico e cruel.




Gosto dos venenos mais lentos!
Das bebidas mais fortes!
Das drogas mais poderosas!
Dos cafés mais amargos!
Tenho um apetite voraz.
E os delírios mais loucos.
Você pode até me empurrar de um penhasco
que eu vou dizer:
E daí? Eu adoro voar!

(Clarisse Lispector.)



"É pensando nos homens que eu perdoo aos tigres as garras que dilaceram." (Florbela Espanca.)

                         


“Pela primeira vez, o sol beijava minha face nua, e minha alma inflamou-se de amor pelo sol, e não desejei mais minhas máscaras.”