segunda-feira, 3 de janeiro de 2011


"Se tens um coração de ferro, bom preveito. O meu fizeram-no de carne, e sangra todo dia." Saramago.

 
                             "O mar é o universo perto de nós." Saramago.



 Caminhava eu a passos apressados que mal me deixavam apreciar as inscrições nos muros, as várias histórias, em minhas decisões um objetivo comum, que me lançava desprendendo-me do mundo, e colocando em  minhas mãos uma flor.
Tu vivias lá, no mundo esteticamente perfeito, na redoma que construísse a mãos de ferro, com material forjado na perda da tua sensibilidade, na ausência de afeto exageradamente verdadeiro que te assegura a sanidade.
Eu trabalhava absorta, em sedes e ambições que só conhecia em mim que nasceram de literatura e canção, e jurava um dia colocá-las numa mochila, ou numa garrafa vazia, dentre estas tantas que consumi, partir sem rumo, partir, e depois partir ainda, sempre em forma de tempestade tropical, dos lugares e dos corações.
Tu estavas de férias, passeando a esmo quando nos esbarramos, e como nada desejavas decidiste então por diversão desejar a mim, experimentavas desejar...
Naquele quarto de hotel estávamos fatidicamente juntos, os dois despidos, eu porquê esperava que não houvesse ninguém lá e por isso senti vontade de estar, tu porquê o designaram e não faria diferença, iria ficar.
Tentei desvendar as correntezas do imenso profundo teu, onde perdi minhas loucuras e verdades, me deleitei em teu marmóreo inverno, nas infindáveis salinas quando nas vertigens acreditava ter achado o caminho.
Alimentasse teu ego, inflas-te teu narciso a duras custas, entre batalhas e dragões até cansar.
Amanheceu, então me beijas-te a testa, me jurasse estima, e escreves-te um bilhete mostrando onde sempre poderia te achar, partisse num silêncio sem volta.
Eu sai do quarto, e chovia, agradeci a chuva, pois assim ninguém poderia distinguir pranto e chuva, e as duas coisas seriam uma só, uma intensidade só, tão grandes e naturais, agradeci também aos trovões que abafavam meus gritos de desespero, minha ânsia de me desfazer, ou de me fundir ao horizonte.
Percebi que precisava de paz, aquela paz silenciosa; lembrei que quando mergulhamos, sucumbimos o mundo e seus sons, os cabelos dançam orquestralmente.
Entrei no mar, e continuei a entrar até o mar entrar em mim, até nada ouvir, até nada sentir e nem ver, a não ser a tua imagem, que ia me abandonando calmamente uma ultima vez.





"É diante do mar que o riso e a lágrima assumem uma importância absoluta." Saramago.